quinta-feira, 18 de julho de 2013

Detesto livros



Em pouco mais de três anos mudei de casa duas vezes. Explico. Uma das vezes tive que me desfazer de um andar que tinha alugado, onde vivi mais de 30 anos e onde guardei mais de oito mil livros. Como fazia desse andar a minha biblioteca rarmente pernoitando, a senhoria reclamou pois eu vivia na mesma cidade noutra habitação. Foi uma mudança dantesca. Ao volume de livros juntou-se um grande número de revistas que iam desde a Histoire (tinha desde o primeiro número)  às revistas de Filosofia e Ciências Humanas que sendo geralmente temáticas nelas encontrava referências sobre quase tudo o que precisava para uma aula ou para escrever sobre um tema. Muitas revistas de política, com colaboração muito variada. Escritas em português, inglês ou francês. Ideológicamente de esquerda mas com várias tendências. Os caixotes que de lá sairam foram encher corredores e quartos da casa onde até há 2 meses habitei. Nunca mais consegui pôr em ordem tudo o que tinha trazido. Sendo uma compradora de livros quase compulsiva aos caixotes fui juntando mais livros e revistas que comprei ou mandei vir . Um caos que pensei semi-organizado contrariando a teoria. Juntei um pouco de tudo pois não sou leitora de um único assunto... interesso-me por várias áreas do conhecimento num enciclopedismo bacoco, dificil de digerir em grandes porções o que me obriga a depenicar os livros como os pássaros fazem às sementes em campo lavrado. Não necessito dar-vos a conhecer o prazer da descoberta e do encontro com os livros. O prazer de, após uma longa estadia fora da casa-dos-livros em lares arrumadinhos e a cheirarem a produtos de limpeza cujo odor se podia confundir com fruta fresca pronta a ser comida ou bebida em sumo, meter a chave de novo à porta e, mesmo antes de acender a luz, levar com uma pilha de livros em cima dos pés porque a mala de viagem tinha abanado o móvel da entrada onde estes se equilibravam! Ao mesmo tempo o cheiro a papel ...hummm.... uma brisa que me leva aos tempos em que em Santarém estudava na Biblioteca Anselmo Brancamp Freire e que nos ia "cobrindo de sabedoria" conforme nos aproximavamos  do "templo" que era a dita.... Silêncio. Cabeças inclinadas sobre os livros. Um recolhimento como que religioso.
A última mudança foi pior. Os livros sairam das minhas mãos e dos meus olhos e guardei-os num armazém onde ficarão depositados até de novo me acompanharem não sei ainda para onde. Será talvez a nossa última viagem juntos. A pouco e pouco as memórias de uma vida vão desaparecendo. Sejam elas livros ou pequenos objectos que trouxemos daqui ou dalí.
Em Outubro deve chegar o meu iPad. Já tenho ebooks para a minha biblioteca virtual. Na minha bolsa carregarei centenas de livros e muitas, muitas, músicas. Estarão organizados como os outros nunca estiveram. Até posso fingir que dobro uma página e que os sublinho a cores sem danificar as obras. Imaginarei os cheiros. Fingirei a realidade.

A propósito, aconselho a leitura do artigo que me levou a esta divagação. Espero que gostem e...basta carregar no link.


I hate books

They're heavy and they make moving impossible. But an iPad just doesn't hold the same memories.